segunda-feira, 12 de novembro de 2012

DIÁRIO DE UM CAPOEIRA - PARTE II


Mestre PEROÁ - 2ª geração de BIMBA


A próxima parada foi Itacaré-BÁ, em 10.09.2012. Conhecemos os mestres Peroá e Jamaica, ambos da linhagem de Mestre Bimba.

Itacaré é uma pequena cidade localizada na costa sul da Bahia, a 150 Km de Salvador.  Sua população, em torno de 27.000 habitantes, possui traços marcantes da mistura das raças, branca, negra e índia. Nessa cidade, bastante visitada por turistas de todas as partes do mundo, onde a colonização portuguesa teve início por volta de 1530,  a capoeira também está presente.



Mestre Peroá(azul) e alunos
MESTRE PEROÁ é o fundador da Associação de Capoeira Filhos de Zumbi. Com área construída em torno de 100m2, vão livre, sem coluna central, construção sólida, com 4m de pé direito, a Associação desenvolve, através da capoeira, trabalhos sociais na comunidade. 
Segundo relato do próprio mestre, a sua iniciação na capoeira deu-se na rua, ingressando em seguida em um grupo, deixando-o após algum tempo para treinar com o já falecido mestre Zoião, discípulo de Mestre Bimba, tendo este o tornado Mestre de Capoeira. Passou a ensinar capoeira nas praças a crianças e pré-adolescentes, tendo o seu trabalho sensibilizado um empresário local que deu-lhe a área onde hoje funciona a Associação. Com o terreno e apoio do comércio local, conseguiu os materiais para a construção e com ajuda de alunos e outras pessoas construiu o prédio. Precisava agora legalizar, e foi assim que nasceu a Associação de Capoeira Filhos de Zumbi.

                                                                                                                                                                                           Naquele espaço simples, limpo e arejado, sentados em um banco lateral, logo abaixo do nível da janela, recebendo a brisa marinha da costa de Itacaré, aquele relato fluía com naturalidade, honestidade e principalmente, humildade. Humildade no sentido de se colocar pequeno diante dos princípios que segue.


Desenvolve uma capoeira bem alinhada com a abordagem da sociabilização. Ele começa a internalizar aquilo como uma missão, passando a perceber a sua posição dentro do contexto social, isto é, ter a visibilidade  da nobreza da sua função no desenvolvimento social, em espaços onde  a presença do Estado não alcança eficácia, contudo através da capoeira se pode chegar, mesmo em pequena escala. Isso é inspiração, e ela não surge do nada. Ela é o espelho, visível somente para alguns. Como a semente, escolhida para germinar. De Zoião recebeu os fundamentos, sua inspiração. Mestre Zoião, um seguidor, transmitiu os princípios aprendidos com Mestre Bimba, portanto, seu espelho.

Em quem Mestre Bimba se espelhou? 





As rodas de capoeira são distintas na sua abordagem.

Painel lateral
Normalmente em espaços como o do Mestre Peroá, se cultiva a capoeira como indutora de princípios, onde o respeito enobrece e a humildade fortalece. Os alunos, em geral, são os próprios nativos. A mensalidade existe, pequena, mas existe. Ainda assim são poucos os alunos,  porém, desenvolvendo o senso de disciplina e de respeito, preparando-se para o exercício da cidadania. Alguns incorporam a capoeira com tanta força que tornam-se viajantes do mundo.  São professores, contra-mestres e mestres pelo mundo afora. São sempre seguidores e realiza seu trabalho espelhado no mestre que lhe ensinou.
Contudo, podemos encontrar algumas exceções, como o Núcleo de Patamares da Filhos de Bimba Escola de Capoeira, que conta com o apoio da Fundação Mestre Bimba - FMB, onde o objetivo do projeto é penetrar em um segmento social com potenciais formadores de opinião e mostrar para essas crianças e pré-adolescentes o verdadeiro sentido da capoeira, a fim de que no futuro tenhamos uma voz espontânea nos fóruns de decisões. O grupo é pequeno, paga mensalidade e contribuem em todos os eventos que participam. Nesse segmento não se busca a formação de professores, mas fortalecer princípios nessas potenciais lideranças. Mestre Garrincha, segunda geração de Bimba, desenvolve há seis anos esse trabalho. Ver matéria postada em 19.10.2012

                                                                  
Em academias com grande número de alunos, bem montadas e bem administradas, também se pratica uma boa capoeira, não obstante os seus objetivos serem outros. São organizadas como empresas. Exploram um segmento de mercado voltado para a cultura física, ávido por alternativas para manutenção de performance, sendo mais frequentadas por alunos de classe média em razão do valor das mensalidades. Esses alunos não têm pretensão de ensinar capoeira e não buscam o seu lado lúdico. A grande maioria são universitários e/ou pequenos empresários.

Explora também um outro segmento que é o do entretenimento, onde ela é inserida dentro de um contexto folclórico.

Recentemente, a FMB, recebeu a visita do Contra-mestre Jagunço, do Rio de Janeiro - onde a capoeira foi severamente reprimida no início da República - exclusivamente para falar com mestre Nenel. “Vim beber na fonte”, foram as suas palavras.      “Não se pode dizer que é capoeirista se não bebeu na fonte”. Continuou emocionado. “Eu sei que não pratico muitas das coisas daqui, porisso não posso dizer que pratico a capoeira regional”. 
Na sua saída, gentilmente nos convidou para um show folclórico, do qual fazia parte nas cenas de capoeira. 

A leitura de livros também mostra diferenças de abordagens:
- Livros ricos em referências e citações, com farto, valioso e legítimo conteúdo histórico, seus autores, em geral, contam a história; 
- Livros que relatam aprendizado, vivência e experiência, seus autores, em geral, transpiram um compromisso histórico. Normalmente eles contam a sua história. Através delas garantem a mensagem para as próximas gerações.


“Meu mestre foi Salomão, sou discípulo que aprendo e mestre que dou lição”, diz um cântico da capoeira.

Podemos notar também abordagens diferenciadas, no próprio Regulamento Internacional da Capoeira, nos artigos 3º e 4º. 

Artigo 3º - Considera-se como prática do desporto formal da Capoeira, para efeitos legais, sua manifestação cultural sistematizada na relação ensino aprendizagem, havendo um ou mais docentes e um corpo discente, onde se estabelece um sistema de graduação de alunos e daqueles que ministram o ensino, havendo uma identificação estabelecida em uniformes e símbolos visuais, independentemente do recinto onde se encontrarem.

Artigo 4º - Considera-se como prática desportiva não formal da Capoeira, para efeitos legais, sua manifestação cultural, sem qualquer uma das configurações estabelecidas pelo Artigo anterior, e que seja praticada em recinto aberto, eminentemente por lazer, o que caracterizará a liberdade lúdica de seus praticantes.

O mestre Peroá ensina a capoeira regional e tem o seu mentor, Mestre Bimba, em tela pintada, fixada em local de destaque no salão.

Ainda em Itacaré-BA, conhecemos o mestre Jamaica, assunto da nossa próxima narrativa.







Um comentário:

Unknown disse...

Boa noite, a FBEC/FMB convida a todos seus integrantes para se fazerem presentes domingo dia 18 nov 2012, no nucleo patamares, ás dez da manhã , para podermos confraternizar pela conclusão do curso de especialização I, do Prof Marivaldo Costa Jagunco, onde haverá uma roda pra galera vadear e o feijão vai rolar por conta do mesmo, quem quiser levar sua cerveja e refrigerante, fique a vontade, contamos com sua presença, axé!!!